Entrevistas  21/06/2022 | Por: Pedro Damian

Entrevista

Marcos Antonio Carpeggiani

presidente da ABIARB e do SINDIBOR, e diretor-geral da Zanaflex Borrachas, com participação de Reynaldo Lopes Megna, ABIARB.


“Os hábitos de consumo estão mudando e a determinação  é que tenhamos um futuro sustentável e melhor.”

BORRACHA ATUAL – Qual o panorama do mercado de borracha brasileiro e mundial?
MARCOS CARPEGGIANI: É difícil definir o que é atual nesse mundo de mudanças constantes. O panorama atual não é um sentimento do dia. Às vezes é o sentimento de um, dois meses atrás. A cada dia que acordamos, os panoramas, os cenários mudam rapidamente. Acredito que isso irá continuar constantemente em nossas vidas. Os sintomas da pandemia ainda se fazem presentes. Aqui no Brasil esperava-se que fossem amenizados desde o final do ano passado, mas com a virada do ano, com as festas de final de ano, fomos surpreendidos já em janeiro e isso afetou bastante. A indústria foi bastante afetada já em janeiro por paralisações. Para se ter uma ideia específica, da série histórica que temos na Zanaflex, janeiro foi o pior mês. Histórico!

E normalmente, janeiro é um mês bom... os colaboradores estão voltando...
Marcos: Sim, estão voltando, mas falo de afastamentos por Covid. E isso aconteceu como regra geral. Então, para uma indústria que esperava voltar forte em janeiro, já tivemos algumas ocorrências ruins. Se bem que agora o panorama já melhorou bastante. Mas já temos aí, dentro do cenário atual, que não é restrito ao Brasil, um cenário de inflação alta, os juros também vêm subindo junto com a inflação e isso preocupa um pouco no movimento de recuperação.

A causa disso pode ser creditada à conjuntura internacional?
Marcos: Sim, podemos creditar à conjuntura internacional e afirmar, felizmente, quando olhamos para os números de encerramento que são oficiais do IBGE, do CAGED, é que o setor da indústria de borracha cresceu neste ano, mesmo quando comparado com outras indústrias de transformação em geral. A nossa produção física industrial aumentou 18,5% em relação à recuperação que tivemos nos anos de 2020 e 2021, o que é normal.

Estamos falando do setor de artefatos de borracha?
Marcos: Exatamente. Agora, de janeiro a março (não temos os números de abril ainda), foi de 11,9%.

Estes resultados são bons?
Marcos: Sim! São números bons comparados aos de outros setores que tiveram retração – principalmente o setor da indústria automobilística com o qual a borracha tem uma coligação muito forte. Outros números indicam movimentações significativas em relação à exportação. As exportações cresceram 28% em relação a 2020 e começamos a observar uma pequena queda no primeiro trimestre de 2022, de 15%, em relação ao ano passado.

Estas exportações destinam-se a quais países ou continentes? 
Reynaldo Megna: As exportações de artefatos de borracha são prioritariamente para a Argentina (36%), Estados Unidos (13%), Paraguai (7%) e Colômbia (6%). Quanto às importações, destacamos que se referem somente aos artefatos de borracha que compõem o capítulo 40, especificamente, excetuando-se matérias-primas e pneumáticos, inclusive reformados – embora na reforma de pneus o número de importações seja bem pequeno. As importações deste mesmo grupo advém da China (20%), Malásia (14%) – e quando falamos em Malásia, não falamos em borracha natural, matéria-prima e insumo que não compõe esse grupo, Estados Unidos (13%) e Tailândia (7%). Esses são os principais países da balança comercial dos artefatos de borracha do Brasil que compõem o nosso consumo aparente nacional. 

Qual é a situação das empresas brasileiras dentro dessa conjuntura atual, principalmente em relação às dificuldades logísticas e a falta de matéria-prima?
Marcos: De um modo geral, há vários impactos que as indústrias estão vivenciando hoje em dia, principalmente na questão da logística. Esse é um problema que afeta o Brasil e o mundo e não conseguimos fugir desse efeito. Temos o incremento dos custos do frete internacional, e sabemos que a indústria brasileira depende em grande parte da importação de alguns componentes, principalmente de produtos químicos, aceleradores, de alguns elastômeros especiais que são importados e o frete encareceu. Quando essa discussão chega no âmbito comercial com o cliente, ele trata somente do produto e não do frete – que às vezes subiu sete, oito vezes. Esse impacto na indústria é grande e tem que ser considerado. Outro fator que temos visto é o tempo e a demora, estendendo o lead time. Hoje os inventários muitas vezes estão dentro dos navios e as empresas necessitam de um capital de giro muito maior.

“Não vemos o poder de compra do consumidor acompanhar o mesmo índice inflacionário dos produtos manufaturados.”

Estima-se que 30% dos navios estão parados nos portos, ou pelo problema da Covid na China ou da falta de matéria-prima. Essa é uma realidade que atrapalha?
Marcos: Totalmente! Falando nos aspectos que mais atingem o Brasil, o que podemos afirmar é que hoje a cadeia está toda interligada. Na produção de um automóvel que tem mais de mil componentes, se faltar um, o automóvel não sai da linha. É muito importante que haja uma reorganização dessa cadeia logística global e o Brasil não está isento disso. Como também é muito nítido o cenário de semicondutores da indústria automobilística, que está longe de ser resolvido. A indústria brasileira está trabalhando em soluços, principalmente a automobilística, onde vemos um para e anda, para e anda e isso acontece de um modo que toda a cadeia recebe a notícia de um modo repentino. Chega segunda-feira, para uma determinada linha por falta de componente, a cadeia para e sofre a consequência como um todo. Sabemos que a indústria automobilística é carro-chefe de grande parte dos setores industriais no Brasil e no mundo.

“Observamos que as importações caíram e há uma preferência maior pelo consumo interno.”

A falta de semicondutores tende a fazer as empresas a priorizarem modelos mais caros, ou no caso do Brasil de veículos pesados. Isso tem ocorrido com a indústria de artefatos de borracha?
Marcos: Exatamente. O valor agregado do ticket de venda é muito importante para a indústria automotiva que fará essa opção, sim. Dentro do que é comunicado como falta borracha, temos que se especificar exatamente o que é falta borracha dentro da cadeia de suprimentos. Muitas vezes a mídia fala que falta borracha, mas o conceito do que é borracha é bem amplo. Muitas vezes um pneu é considerado borracha e tem sua classificação fiscal, tem a entidade que cuida deste produto, que é a ANIP e temos que nos preocupar muito com esses fatos.  Dentro do Brasil não tem sido noticiada tanta falta e interrupção dos artefatos de borracha para a indústria automobilística. Isso também porque a demanda está muito baixa, ou seja, a capacidade instalada ociosa hoje é enorme dentro da indústria de artefatos.

Temos uma capacidade de produção de 4,5 milhões de veículos.
Marcos: Exato! E a produção está muito aquém disso, mal chegando a 2,2 milhões de unidades. Muito do que é noticiado não é verdade. Temos que investigar melhor o que de borracha estaria faltando para que outras indústrias estejam parando. O Brasil está em uma posição privilegiada, exceto pela questão dos semicondutores e das dificuldades logísticas, que afetam a todos globalmente. No mundo todo há uma inflação alta e dentro da indústria da borracha é normal observarmos que o faturamento das empresas cresceu muito. O real por quilograma cresceu significativamente.

Em valores absolutos?
Marcos: Não vemos o poder de compra do consumidor acompanhar o mesmo índice inflacionário dos produtos manufaturados. Isso é uma grande preocupação, porque em certo momento tudo isso se refletirá no consumo. 

As coisas estão ficando mais caras, o povo ganha menos e assim deixa de comprar. A lógica é essa? 
Marcos: Basicamente é isso. Juros altos, inflação alta, um poder de compra reduzido e é por isso que muitas vezes vemos a dificuldade, inclusive do crédito. A taxa de financiamento subiu muito, a Selic subiu demais e isso dificulta. Mas essa é uma taxa de acomodação, que o mercado vai absorvendo ao longo do tempo e se adequando.

Quanto tempo para o mercado absorver isso e voltar ao normal?
Marcos: Hoje está difícil fazer previsão. Mas considerando os cenários existentes, se as pessoas colocam tudo sobre risco e começam a fazer planos de ação para melhorias, com certeza em algum momento as ações vão se encaixando e indo para o seu lugar correto. Acredito que de 2023 em diante o cenário estará bem melhor, com soluções para a questão de semicondutores junto à indústria automobilística. Essa volta ao normal terá uma acomodação de produção, sem falta de automóvel e nem interrupção da cadeia, além de um processo logístico normal ao longo do tempo e equalizado. Acredito que os preços dos fretes internacionais não cairão em função do preço do petróleo, que vai permanecer alto, mas deverá voltar a um patamar mais competitivo. A questão do lead time deverá diminuir e tudo se ajeitará. É como se tivéssemos embaralhado tudo e as coisas terem ficado fora de ordem. A pandemia não terminou e seus efeitos recentes são sentidos na China.  Esses lockdowns afetarão o transporte marítimo, onde os portos já estão congestionados. O lead time está aumentando e essa política chinesa de Covid Zero paralisa as atividades na própria China, que hoje é muito representativa e causa uma dependência global muito grande de materiais que provêm de lá. 

O novo presidente da ANFAVEA falou que há 29 novas fábricas de semicondutores sendo construídas. Quantas no Brasil? 
Marcos: A informação que tenho é que há necessidade de localização de produção. Ou seja, é importante para soluções futuras se pensar na logística e como vai funcionar a cadeia de suprimentos.

Como as novas indústrias de artefatos de borracha nessa conjuntura podem criar indústrias novas aqui para não ficar totalmente dependentes do mercado externo ou de sistemistas externos? A indústria da borracha pode aproveitar essa nova onda?
Marcos: Sempre acredito que existe a oportunidade mediante os cenários que hoje ameaçam as paralisações da indústria nacional se aproximar muito dos clientes para a solução dos problemas. Observamos que as importações caíram e há uma preferência maior pelo consumo interno. Mesmo porque algumas contabilizações que não existiam no passado passam a pesar bastante, que é o frete. É o tempo de transporte. Então, hoje coloca-se sob risco se há certeza que o embarque ocorrerá no navio ou não. É difícil. Vai haver transbordo? Sim ou não. Se você rastrear um navio hoje verá que muitas vezes transbordou cinco vezes a carga até chegar ao destino e atrasou 30, 60 dias.

Aí nos deparamos com o problema brasileiro da receita federal. Caso o importador pegue um canal amarelo ou vermelho ficará mais quinze, vinte dias por exigência de documentação. Tudo isso é muito a favor da produção local.

Principalmente aqui no Brasil, algumas matérias primas não estão com a oferta muito folgada, mas somos autossuficientes em outras como negro de fumo, SBR e borracha nitrílica. O Brasil não está mal posicionado. A indústria brasileira é competitiva. O dólar a deixa em um patamar que a mantém competitiva. Temos condições, junto com a indústria automobilística de aumentar muito a exportação.

O Brasil está bem posicionado?
Marcos: Acredito que o Brasil vai se posicionar melhor. Na crise da Criméia, em 2014, o Brasil se favoreceu. Agora na questão da Rússia, o Brasil também pode se favorecer. Temos que aproveitar e não só enxergar fatores negativos. Claro que temos problemas estruturais, vários problemas a serem resolvidos. A tributação é um problema comum a toda a indústria. Ela tem que se unir para resolver, junto com suas entidades, as entidades maiores como a FIESP, aqui em São Paulo, a CNI...

Quais os maiores problemas da indústria da borracha e da indústria brasileira atualmente? 
Marcos: Podemos separar os problemas específicos da indústria da borracha e os problemas comuns da indústria. É uma condição sine qua non a questão da tributação. É um problema que tem que ser resolvido. Não há uma indústria que não reclame do sistema de tributação. É complexo, muda diariamente, é difícil se adaptar dentro da indústria, os custos de adaptação são totalmente absorvidos pela indústria, ou seja, as penalizações são altas, os riscos são altos e temos a insegurança jurídica que vem por trás disso. Muito disso que aplicamos no dia a dia de tributação é julgado e isso afasta muito investimento e com certeza também o capital estrangeiro. Resolvendo isso, vai atrair o investimento estrangeiro. 

Estamos sofrendo um processo de desglobalização e talvez seja melhor concentrar a produção localmente?
Marcos: Está sob julgamento esse processo de globalização. As tensões geopolíticas aumentaram muito no mundo em relação aos últimos 30 anos. Tivemos um período de muita estabilidade e agora começamos um momento de muita instabilidade. A tendência, quando temos tensões geopolíticas é de voltar ao processo de internalização da produção, como os Estados Unidos estão fazendo. E a Europa já iniciou esse movimento quando percebeu que estava criando, na indústria da borracha, uma dependência muito grande de produtos químicos em relação à China. Acredito que tem que ser reestudado e rever a aproximação de locais em termos de logística mais próximos da produção e do consumo.

“Tivemos um período de muita estabilidade e agora começamos um momento de muita instabilidade.”

Nessa conjuntura poderia ser interessante para as multinacionais produzirem no Brasil?
Marcos: Há vários fatores negativos que podem influenciar para que isso não aconteça.

Primeiro, como já falamos, é a tributação. Depois, o preparo da mão de obra. Muitos dos planos futuros que teriam que vir para o Brasil necessitariam de um plano mais de longo prazo. Investimentos que possam ocorrer aqui, como o de semicondutores, é de longo prazo sendo uma decisão de que caminho percorrer para o futuro em relação a determinadas indústrias. Isso falamos muito em relação à indústria automotiva que poderá seguir soluções para cada continente e temos aqui soluções ótimas para o Brasil. Temos o etanol, temos exemplos de motores a combustão a etanol e híbridos com etanol, gerando muito menos emissão de gás carbônico do que um veículo elétrico na Europa. A decisão do investimento para o Brasil para certas empresas culminava em ir para o hidrogênio, ir para o carro elétrico ou ir para o carro a combustão. E a indústria da borracha toma a carona em todas essas decisões de investimento. Temos que olhar claramente para onde vai a indústria consumidora, para onde vai o consumo futuro.

A borracha vai se beneficiar com a eletrificação da mobilidade brasileira?
Marcos: É difícil responder, porque as projeções para o Brasil, por enquanto, para os próximos anos, não são otimistas em relação à produção de carro elétrico aqui. Estimamos que em 2030, 2035 talvez, possamos ter 10% dos carros vendidos (o que é pouco, em relação às outras tecnologias). É uma decisão ainda da indústria automotiva qual o caminho percorrer, mas com certeza um carro elétrico terá menos componentes de borracha que um carro de motor a combustão. Por outro lado, o carro com motor a combustão híbrido elétrico tem mais componentes. Depende muito desse caminho. Os investimentos que serão feitos no Brasil e no mundo têm fundamental importância nos estudos da cadeia desde o início até o final. Muitas vezes, afirma-se que é melhor comprar um carro elétrico para não gerar gás carbônico na atmosfera. Tudo bem, isso é uma decisão individual. Só que se na somatória da cadeia de fabricação que temos lá na ponta, que para produzir uma bateria é necessário movimentar 250, 270 toneladas de minério e que isso consumiu pneu, combustível e gerou muito CO2. Em quantos anos haverá o balanceamento? Então temos que avaliar muito bem o negócio em si no planejamento. Qual tecnologia cada país vai escolher? Por exemplo, o Japão está indo para o caminho do hidrogênio, Europa está em eletrificação e o Brasil talvez vá para outros caminhos. Mas é muito importante que se decida um caminho. Um caminho tomado errado significa prejuízo ou então até uma questão de não continuidade.

Caso o Brasil continue a usar o etanol nos motores a combustão, poderíamos ser fornecedores mundiais de autopeças para esses motores, enquanto outros países estão eletrificados? É uma oportunidade?
Marcos: Vai depender muito do consumidor. Ou seja, muito da questão da comprovação daquilo que se quer. O grande objetivo que as empresas de capital aberto estão se pronunciando, do ESG, vão no sentido da valorização da ação dessas empresas em prol do movimento do meio ambiente, do social e da governança. 

Se conseguir fabricar um produto que gere esses benefícios, ele vai vender. Ou seja, se um motor a combustão via etanol for mais eficiente que uma solução elétrica para um país que não tem condições de produzir energia elétrica, que não seja via combustível fóssil, talvez isso seja sim uma oportunidade. Temos visto vários aspectos de regulamentação ou de padronização, como no caso dos pneus – e muito poucos consumidores compram pneus olhando o selo de identificação. Pode ser que o automóvel no futuro já saia com essa padronização de geração de gás carbônico. E aí já fica uma opção para o consumidor. Aí é que eu digo que às vezes a solução do motor híbrido possa ser a solução ideal para aquele país.

Então é só planejar, cumprir e executar?
Marcos: Sim. É só fazer isso...

Existe uma real falta de técnicos especializados para a formulação da borracha?
Marcos: A pergunta vem bem de encontro à formação. Um sistema de educação bem preparado acaba formando bons profissionais. A indústria precisa estar preparada é para as transformações. Os mesmos países que decidiram já fazer o processo de eletrificação não têm profissionais suficientes para as novas montagens de empresas. Ou seja, não adianta criarmos empresas se não tivermos profissionais para operá-las. Precisa ter bons programadores. A eletrificação de automóveis precisa de muita programação. Onde estão os programadores? E a formação tecnológica? Não adianta somente idealizar as coisas e sim fazer todo um planejamento. E a mão de obra é um desafio não só para o Brasil, mas para o mundo inteiro na direção que os investimentos irão tomar.

Temos uma escassa formação de mão de obra, mas algumas de muito boa qualidade. Essa carência também é vista em outros países que acabam “roubando” os bons profissionais. Isso tem solução? Só patriota fica no Brasil?
Marcos: Tudo depende muito do retorno financeiro. Por quê as pessoas vão embora do país? Às vezes é um desafio profissional. Muitas vezes é o salário e a segurança do país aonde se vai viver. O Brasil precisa resolver seus problemas conjunturais para que as pessoas fiquem aqui. Sempre acreditei que para que as pessoas trabalhem dentro da empresa, não só de borracha, tem que remunerar bem. É preciso remunerar bem um técnico de borracha, precisa dar valor às coisas produzidas aqui. Muitas vezes não é culpa da indústria. É culpa da tributação, do sistema. Devemos resolver nossos problemas mais pesados como a tributação e a questão de ter uma política industrial – porque hoje há uma ausência de política industrial. Não sabemos aonde a indústria vai estar daqui a vinte anos, enquanto a China já planejou para cinquenta anos. É diferente você ter um planejamento e não saber aonde vai chegar ou não ter uma representatividade no governo. Hoje somos carentes de representatividade no congresso. 

Dá para afirmar que o planejamento não é o forte do brasileiro?
Marcos: Sim. 

A época da improvisação já passou? 
Reynaldo: Essa é uma situação delicada para o setor privado, produtivo. Porque o governo não oferece condição para o setor privado se planejar adequadamente. Tivemos há pouco a revogação de uma redução do IPI, e aí foi criado um limbo jurídico em que não se sabe que IPI você deve recolher porque estão ligados aos produtos fabricados na Zona Franca de Manaus. Todos os produtos que possuem processo produtivo básico publicado por portaria e estão proibidos, no caso, foram excetuados do decreto 
no que tange à redução do imposto. E quais são esses produtos? E aí entramos em dúvida na área tributária, um exemplo dentre muitos que acontecem todas as semanas e que tornam a vida do empresário um desafio inimaginável.

Isso pode acontecer?
Reynaldo: Foi o ministro Alexandre de Moraes quem editou o decreto, excetuando esses produtos da lista. Não entro no mérito se está correto ou não proteger uma política de produção na Zona Franca de Manaus, mas criou uma insegurança jurídica sem dar o tempo devido para esclarecer como proceder, fazendo com que talvez todo o desencadeamento de problemas seja maior que o remédio que ele deu para a situação. Não somente haverá incerteza no recolhimento do IPI, mas de todos os tributos vinculados àquela operação. Como se retrocede depois para corrigir tudo isso? 

Recolhimento errado pode gerar recolhimento adicional com multa? 
Reynaldo: As empresas menos “ousadas” – daí entra a falta de condições para planejamento – devem provavelmente recolher pelo topo da alíquota para se garantir. Do contrário vão recolher pela menor e eventualmente, se depois forem apontados, vão ter que incorrer não só no recolhimento da diferença, mas nas verbas acessórias também, multa e juros.

O recolhimento pelo topo será repassado no preço dos Tears 1, Tears 2 e finalmente para o consumidor final?
Reynaldo: E aí teremos uma cadeia de compradores exigindo que você trabalhe em uma fração menor de recolhimento, acabando por abalar mais uma vez a concorrência leal e tornando-se refém da situação. 

O próximo governo, seja ele qual for, resolverá esses problemas?
Reynaldo: É importante que visualizemos este exemplo como não sendo necessariamente um problema de governo executivo. Há um ativismo judiciário muito forte no país – e não falo só do Supremo – que faz com que o Brasil tenha dois poderes executivos. Isso atrapalha demais a administração das empresas no dia a dia. Quando falamos de reformas estruturais, não só a tributária, é no sentido de repensar o sistema político do nosso país, o sistema de poderes e isso embarca também a reforma administrativa, atingindo o setor público, tirando um pouco do peso, do excesso de Estado em cima do setor privado. E aí podemos começar a imaginar a aproveitar o nosso potencial exportador, pois há um mundo de compradores. Já hoje, não precisamos esperar a eletrificação. Existem muitos interessados em produtos acabados e nós somos muito competentes para isso. Temos competência para fabricar e vender no mercado externo, como já exportamos US$ 300 milhões por ano aproximadamente, o montante exportado pelo setor de borrachas. Precisamos de um pouco de incentivo como a equiparação isonômica de tratamento tributário em relação a quanto paga uma fábrica nos Estados Unidos e uma aqui, por exemplo. Se conseguirmos dar esse nivelamento, pode ter certeza que seremos bastante competitivos.

A diferença é muito grande?
Reynaldo: Entre 15 e 20%, dependendo do caso. 

Qual a expectativa para a Expobor?
Marcos: A expectativa é boa, ótima. Acabamos adiando duas vezes. Alteramos a data e alterar a data de feira não é uma tarefa fácil. A primeira edição ocorreu em 1996. Já temos experiência das edições das feiras, que sempre são realizadas pela ABIARB, a nível nacional, sendo que a Francal é a promotora. Desde 1996 trabalhamos em conjunto e a edição de 2020, que era para ter ocorrido há dois anos, acabou sendo adiada por uma vez, muita batalha, muita alteração de situações, principalmente comandadas por legislação municipal – que regia se podíamos ou não realizar a feira, em conjunto com a Francal, passando por várias fases das deliberações da prefeitura sobre e Covid, taxa de ocupação, restrições...
Isso gerou muita incerteza. Os expositores questionaram a todo momento. Mesmo a posição atual para a feira que vai ocorrer era uma incerteza no ano passado. Passamos por muitas dificuldades. O pessoal está muito ansioso pela volta do presencial porque temos muita história para contar desse tempo que pulamos o evento. Temos que considerar que a última feira era para ter sido realizada em 2020, dois anos após a anterior, totalizando quatro anos. E tem muita história para ser contada desses quatro anos. Muita inovação tecnológica, muitas mudanças dentro das empresas, o ambiente mudou, a situação de trabalho, as pessoas muitas vezes mudaram de local.

Claro que será um evento mais localizado a nível Brasil e América Latina, vai ocorrer junto com o Congresso da Tecnologia da Borracha promovido pela ABTB, sempre com a Pneushow, que é o principal evento do setor de reforma de pneus... e temos lá a unidade móvel do SENAI.É um evento bem importante, tem o apoio de várias entidades, como a SLTC, que vem convidando o pessoal da América Latina. Não acreditamos que haja muita participação do pessoal de outros continentes, pois não sabemos quais as restrições que estarão sendo aplicadas no momento da realização da Expobor em relação à Ásia, que está com restrições de movimentação.

Como a Expobor está se aproximando, não acreditamos que esse pessoal irá comprar ticket aéreo. A Europa preocupada com a crise da Ucrânia com a Rússia. A China envolvida com surto da Covid. Acreditamos muito no eixo das Américas. A movimentação maior virá daqui. 

Todos os grandes e importantes expositores estarão presentes?
Marcos: Exatamente! Esperamos receber mais de 8 mil visitantes e reunir mais de 75 expositores nos 17 mil metros quadrados do Expo Center Norte. Peço que coloquem na agenda: 22, 23 e 24 de junho, das 13 às 20 horas, estão todos convidados. Incentivem! Precisamos retomar as atividades e realinhar os negócios. A Expobor é o evento mais importante para a indústria de artefatos de borracha.

Como será o novo normal?
Marcos: Temos que nos acostumar com esse mundo de constantes mudanças que estão acontecendo, sejam ambientais, sociais, econômicas ou tecnológicas. Os hábitos de consumo estão mudando e a determinação é que tenhamos um futuro sustentável e melhor. Esse é um objetivo global. Para nós, que trabalhamos na indústria de artefatos já vemos um movimento de produtos de borrachas recicláveis, renováveis, com baixa geração de CO2 na cadeia... E isso deve gerar as regras futuras da cadeia de fornecimento.

A economia circular será uma realidade?
Marcos: Sim. E nós teremos que nos acostumar com essa dinâmica. Ela é muito positiva, porque traz inovação, traz progresso, traz desafio. Temos que pensar positivo. Não nos abalarmos pelos problemas que já identificamos e procuramos correr atrás de soluções. Acredito que somos competentes para alcançar isso, temos que batalhar juntos, ter propósitos comuns, uma unificação maior e uma junção de forças.

Uma mensagem para o futuro!
Marcos: A mensagem que eu tenho é que tudo seja muito positivo para o futuro. Vamos participar da Expobor, vamos torcer para a pandemia virar endemia, entrar nos ciclos de vacinação, confiar na ciência, confiar nas pessoas que estão aqui no Brasil. Eu confio no meu trabalho. O Reynaldo trabalha muito para defender todos os interesses da indústria junto ao SINDIBOR. Ele é o executivo do dia a dia. Ele deu o exemplo do IPI, mas temos muitas outras frentes de trabalho, comissões que estamos trabalhando dentro da indústria da borracha, como de inovação e tecnologia, tratamento de assuntos tributários específicos da indústria da borracha.

Reynaldo: Convidamos a todos a interagir com maior intensidade daqui para a frente, porque naturalmente cada segmento da cadeia produtiva, se pensarmos na indústria química, até os próprios setores demandantes possuem expectativas particulares, problemas particulares, mas nós do setor de borracha dependemos muito dessa troca de informação. A informação é a moeda do futuro e o nosso futuro no Brasil depende bastante dessa interação. A ABIARB, o SINDIBOR e as entidades estão de portas abertas para receber as demandas do setor para serem discutidas internamente para que possamos provocar os associados.
Costumamos dizer que 80% do faturamento do setor é associado da ABIARB e do SINDIBOR. São 109 associados que agregam 80% do faturamento do setor. As críticas são bastante valiosas e a partir daí podemos criar propostas direcionadas ao poder executivo, ao legislativo e até mesmo ao judiciário e fazer com que possamos construir um ambiente mais saudável para empreender no país e sobretudo em nosso segmento de borracha.